Cinza
As vezes é assim que amanhece o dia:
— Sem a imensidão azul.
E de repente a dor toma o céu inteiro
sem espaço para outros pensamentos-nuvem.
Dói em mim o que nem acredito existir.
Eu sei que bate algo no peito
mas não é o coração que pensa ou sente
e nem o estômago que revira de medo.
Sei também que embora enxerguem,
não são os olhos que vêem
o mundo sem cor
e embora perceba sabor
não é a língua que sente o amargo da vida.
Sei de tudo isso e mais além
mas não acho que exista
a alma que tantos e tantas crêem.
Acho mesmo é que morte é fim
e ao mesmo tempo,
ainda que saiba que são cones e bastonetes
que interpretam cor e escuridão
– e os meus funcionam perfeitamente –
hoje é um dia cinza.